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Santa Clara de Assis

Santa Clara de Assis

É quase impossível não apaixonar-se por Santa Clara, conhecendo-a. Muitos pensam que Clara foi namorada de São Francisco, que eles tiveram um romance. Há poucos dias, uma adolescente me perguntou: “Santa Clara é aquela que foi casada com São Francisco?”. Não, minha querida, eles não foram casados, respondi. E ela disse-me: “Então vivi enganada até hoje”.
Clara e Francisco viveram na mesma cidade, Assis, Itália. Francisco nasceu em 1181 ou 1182; Clara nasceu em 1193. A família de Francisco pertencia a uma classe mais simples, a burguesia. Clara pertencia à nobreza, classe social mais elevada. Francisco e seu pai sonhavam fazer parte desta classe social. Para isso, ele foi para a guerra na tentativa de consagrar-se cavaleiro e tornar-se nobre. Mas Deus o quis como cavaleiro do Senhor.
A história desmente o boato de que foram namorados, que foram apaixonados, pois, no tempo da juventude de Francisco, a família de Clara não ficou residindo em Assis por causa das guerras. Quando a família retornou, Francisco já havia iniciado o seu processo de conversão, que durou alguns anos.
A história de Clara se insere na história franciscana e na história de Francisco. Lembremos que Francisco, diante do Crucifixo de São Damião, ouviu uma voz: “Francisco, vá e reconstrua a minha Igreja”. Ele começou a reconstruir a Igreja de São Damião, onde, anos depois, Clara foi morar com outras mulheres consagradas ao Senhor.
Enquanto reconstruía a Igreja e pedia esmolas para a obra, Francisco dizia: “Venham me ajudar na obra do mosteiro de São Damião, porque nele ainda haverão de morar umas senhoras cuja vida famosa e santo comportamento vão glorificar nosso Pai celestial em toda a sua Santa Igreja”.
Por séculos pouco se falou sobre Clara. Apenas no século XX a história fez justiça a ela. Frei José Carlos Correia Pedroso, in memória, um dos maiores estudiosos de Clara, diz que “a descoberta de Santa Clara é a maior graça que o Franciscanismo recebeu no século XX”. E acrescenta: “Hoje, não dá mais para aprofundar o carisma franciscano sem um bom conhecimento das propostas de Clara de Assis, que divide com Francisco a originalidade desse dom feito à Igreja desde o século XIII.”
Clara, por ser de família nobre teve uma fina educação e privilegiada formação. Segundo o escritor Tomás de Celano: “O pai era militar, e a família de cavaleiros, dos dois lados. A Casa era abastada e as riquezas, para o padrão local, copiosas”. Uma testemunha no processo de canonização, chamada Irmã Pacífica de Guelfúcio relatou o seguinte, ao falar sobre a vida de Clara na casa de seu pai: “disse sob juramento que conheceu Clara, enquanto esteve no século na casa de seu pai; e que era tida por todos os que a conheciam como pessoa de grande honestidade e de vida muito boa; e que se dedicava e ocupava com as obras de piedade.”
Clara foi uma mulher extraordinária, com vigor em suas posições, ternura nas atitudes. Ela deve ser vista sob a luz de um dos maiores exemplos de cristificação pessoal vividos na história do movimento franciscano, e mesmo de toda a Igreja.
Também pensa-se que ela foi uma plantinha de Francisco, no sentido de ter ficado à sombra dele, de ter sido menos que ele, subordinada a ele. Grande engano.
Clara quis seguir Cristo em sua pobreza. Ela não quis apenas ser pobre. Ser pobre por ser pobre não teria nenhum sentido, e continua a não ter. Clara apaixonou-se por Jesus desde a infância, e este amor cresceu até aos sessenta anos de vida, quando veio a falecer. Foi esposa pobre de Cristo Pobre. Viveu abraçada ao Cristo pobre como uma dama pobre.
Clara teve um papel fundamental na espiritualidade de Francisco. Segundo o escritor Eloi Leclerc, a entrada de Clara na vida de Francisco não foi um simples episódio. O acontecimento significa na vida de Francisco uma acolhida em profundidade, uma abertura no plano do ser. Para pertencer totalmente a Deus, Francisco havia renunciado radicalmente à mulher. E eis que ele a encontra no seu caminho, mas sob os traços da virgem consagrada. E a acolhe, não em função ou como complemento do homem, mas na sua vocação pessoal e transcendente, no seu ser consagrado, para além do desejo carnal. Do ponto de vista psicológico e espiritual, não se poderia exagerar na importância deste acontecimento na vida de Francisco. No homem, por mais dedicado que seja seu serviço a Deus, não é possível nenhum acesso à maturidade espiritual, não somente fora de alguma influência feminina que sensibilize a sua inteligência e a sua vontade e complete de algum modo a sua alma, mas sobretudo, fora dum acolhimento da mulher como tal, dum reconhecimento do seu ser próprio, da sua vocação pessoal e da sua dignidade espiritual. A mulher, assim acolhida e amada por causa dela mesma, para além do desejo carnal, deixa de ser um mito, para tornar-se símbolo de um mistério que se situa mais alto que ela, mas cuja luz, inacessível em si mesma, passa através dela. É nesta profundeza, no nível das primitivas potências afetivas, que se deve situar a ação de Clara na vida de Francisco. Eloi Lecrerc mostra-nos que sem Clara, Francisco não teria chegado às profundezas de seu ser e se reconciliado com os contrário que existiam fora e dentro dele.
Francisco também procurou Clara em momentos decisivos de sua vida e ela sempre o orientou com muita precisão.

 

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